segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Polícia Federal já tem imagens de suspeito de crime eleitoral


Do jornal pequeno



PAGAMENTO DE CONTAS EM TROCA DE VOTOS EM SÃO LUÍS




Homem identificado como Bruno pagou, numa lotérica do centro de São Luís, contas de luz, água e telefone, no valor de mais de R$ 28 mil, pouco antes das eleições



Oswaldo Viviani



O delegado federal Rodrigo Correia – que investiga o caso das contas de luz, água e telefone pagas em troca de votos nas últimas eleições – recebeu na quinta-feira (21) as imagens da câmera instalada no escritório da lotérica do centro de São Luís em que os pagamentos foram feitos. Nas imagens, aparece com nitidez uma pessoa identificada como Bruno, que pagou, em dois dias – 16 e 28 de setembro –, mais de R$ 28 mil em contas pertencentes a moradores do Centro e de bairros próximos da capital maranhense, como Lira, Belira, Coreia de Baixo, Coreia de Cima e Codozinho. O Jornal Pequeno apurou que o caso envolve um deputado estadual reeleito da coligação “O Maranhão não pode parar”, encabeçada pela governadora eleita Roseana Sarney Murad (PMDB).



A PF também investiga a possibilidade de terem sido realizados pagamentos de grandes volumes de contas, em troca de votos, em outras lotéricas de São Luís. Embora a investigação não corra em segredo, o delegado Rodrigo Correia afirmou ao JP que só vai dar informações oficiais sobre o caso quando as apurações estiverem concluídas.



As imagens – aproximadamente duas horas de gravação – foram entregues à Polícia Federal pelo dono da lotérica em que as contas foram pagas, que também prestou depoimento na quinta.



Em entrevista ao JP na sexta-feira (22), o proprietário da lotérica – que não será identificado para não atrapalhar as investigações – esclareceu alguns detalhes do caso. Ele revelou que dias depois de fazer o primeiro pagamento de contas (perto de 100, no valor de mais de R$ 8 mil), Bruno esteve na lotérica e o chamou para uma conversa, que aconteceu provavelmente no dia 26 de setembro, diante no estabelecimento, no interior de uma caminhonete de cor prata.



No diálogo, que foi presenciado por um outro rapaz, sentado no banco ao lado do motorista, Bruno teria dito que em alguns dias iria ter em mãos outro grande volume de contas de luz, água, e telefone, e queria saber da possibilidade de pagar todas na lotérica em questão.



O dono da lotérica disse que não havia problema, e Bruno ficou de voltar nos dias seguintes, fato que efetivamente ocorreu em 28 de setembro. Nesta data, foram pagas na lotérica em torno de 300 contas, que perfizeram o valor de R$ 20 mil.



No dia 30 de setembro, Bruno regressou à lotérica com outra pilha de contas. No escritório, o rapaz se pôs a separar só as contas dos bairros próximos ao centro de São Luís, enquanto um funcionário do estabelecimento as somava.



Quando o cálculo já chegava a mais de R$ 11 mil, uma repórter da Folha de S. Paulo (Elvira Lobato) entrou inesperadamente no escritório e se identificou.







Desconfiado, Bruno saiu, dizendo que ia beber água. Ao voltar, aparentando nervosismo, recolheu as contas – que somadas dariam “uns R$ 30 mil”, segundo o funcionário da lotérica que as calculava. Afirmou que iria buscar mais dinheiro e que voltaria depois, mas não retornou.



No espaço de tempo em que Bruno esteve ausente, as contas foram fotografadas pela repórter da Folha, que, antes de retornar a São Paulo, fez as imagens chegarem até a procuradora eleitoral Carolina da Hora Mesquita Höhn, autora do pedido à PF para abertura de inquérito.



Esquema criminoso se estendeu a mais de 30 bairros



Acredita-se que o esquema criminoso do pagamento de contas em troca de votos nas últimas eleições tenha se estendido a mais de 30 bairros de São Luís. A maioria deles é próxima ao centro da capital maranhense, mas há uns poucos casos de bairros mais distantes, como Rio dos Cachorros, onde uma entidade assistencial teve sua conta paga pelo esquema suspeito. Trata-se da Associação Assistencial ao Menor Carente Livramento, que tem sede no Rio dos Cachorros (Rua Principal, 113).



A entidade é presidida por Arnaliz Pires Fonseca, que também coordena o grupo folclórico Dança do Boiadeiro Encanto do Rio dos Cachorros. Arnaliz informou ao JP não ter repassado “nenhuma conta para ninguém pagar”.



De acordo com Arnaliz, a pessoa responsável, este ano, pelo pagamento das contas da entidade (de cerca de R$ 200 mensais) é sua sobrinha Lucilene Pires de Moraes, que promoveu alguns cursos na associação, de fevereiro a agosto.



Lucilene, segundo Arnaliz, é ligada a Roseana Sarney e Ricardo Murad e fez campanha para eles nas recentes eleições. Ambos foram eleitos. Roseana escapou de disputar o segundo turno com Flávio Dino (PC do B) por uma diferença de apenas 4.877 votos.



(Oswaldo Viviani)



Ao menos cinco denúncias envolvem os roseanistas



Além do caso do pagamento de contas em troca de votos, a ex-coligação “O Maranhão não pode parar”, encabeçada pela governadora Roseana Sarney Murad (PMDB), eleita no último dia 3 com 50,08% dos votos válidos, está envolvida em pelo menos outras quatro denúncias de crime eleitoral na recente eleição. Três têm a ver com abuso de poder político e/ou econômico: oferecimento de consultas médicas, fornecimento de combustível e facilitação para retirada de carteiras de trabalho – tudo em troca de votos. Uma refere-se a suspeita de fraude (em votação nas urnas biométricas).



Consultas médicas em troca de votos



Na manhã de 21 de setembro, a médica Silvana Teixeira foi presa pela Polícia Federal por suspeita de crime eleitoral. Segundo a PF, Silvana – mulher do ex-vereador ludovicense Deco Soares e prima de Roseana Sarney – estaria realizando consultas médicas gratuitas em troca de votos para os então candidatos Roseana Sarney (PMDB), Ricardo Murad (PMDB), Manoel Ribeiro (PTB) e Luciano Moreira (PMDB). Roseana concorria ao governo do estado. Murad e Ribeiro a deputado estadual. Moreira tentava vaga na Câmara Federal. Todos foram eleitos.



A médica foi presa no local em que estaria sendo cometido o ilícito, uma casa simples localizada na Rua Tadeu Palácio, s/n, Conjunto Residencial Vitória (área do Recanto dos Vinhais). Outras duas mulheres também foram detidas pela PF: Maria de Jesus Monteiro Macedo, a “dona Dijé” (proprietária da casa), e Kátia Regina Alves Mota (paciente que estava sendo atendida no momento da incursão policial). Silvana e as duas mulheres foram soltas na noite do mesmo dia em que foram presas. Roseana e Luciano Moreira negaram envolvimento com Silvana.



Distribuição de combustível em Codó



Também em 21 de setembro, o jornal carioca O Globo publicou matéria de autoria do repórter especial Evandro Éboli, informando que Roseana Sarney deu combustível a participantes de sua “carreata da vitória” em Codó, ocorrida no dia 19 do mesmo mês. “Motoqueiros recebiam 3 litros de gasolina, cada um, no Auto Posto Alencar, para engrossar a carreata de Roseana”, descreveu o jornalista. A assessoria de Roseana Sarney negou ter financiado a gasolina dos motociclistas, e informou não autorizar qualquer aliado a adotar o procedimento.



Distribuição de combustível em Ribamar







Distribuição de combustível em troca de votos também teria acontecido em São José de Ribamar, no dia 1º de outubro. Um flagrante fotográfico mostra uma fila com dezenas de veículos, “plotados” com adesivos de Roseana, esperando para abastecer no Posto Araçagy, localizado na Rua Nova Orleans, 2. A ex-coligação “O povo é maior”, que tinha à frente Jackson Lago, candidato pedetista ao governo, denunciou o fato à Procuradoria Eleitoral.



Transporte para tirar documento com foto



Ainda em 1º de outubro, o jornal Folha de S. Paulo publicou reportagem assinada pela repórter especial Elvira Lobato, informando que, em troca de votos, cabos eleitorais da ex-coligação roseanista estavam pagando transporte para jovens pobres com mais de 16 anos tirarem a carteira profissional.



A Justiça Eleitoral acabara de decidir que o eleitor poderia votar apenas com um documento com foto – a carteira profissional, entre outros. “No Maranhão, cabos eleitorais pagam o transporte para jovens de famílias de baixa renda tirarem a carteira de trabalho e ficarem aptos para a votação. A oferta pressupõe o compromisso de voto nos candidatos que bancam a viagem. A reportagem ouviu relatos dessa compra indireta de votos nos municípios de Cachoeira Grande e Morros”, informou a Folha.



Indícios de fraudes nas urnas biométricas



Alguns dias após a eleição, o ex-candidato ao governo, Flávio Dino (PC do B), segundo colocado no pleito, com 856.402 votos (29,49%), comunicou ao MPE “possível irregularidade” em Paço do Lumiar e Raposa, onde foram usadas urnas biométricas. O MPE apura o caso. Usadas em 60 cidades, as urnas biométricas identificam eleitores por impressão digital. Um estudo da área jurídica da ex-coligação de Dino (“Muda Maranhão”) apontou que as urnas de Raposa e Paço do Lumiar, mesmo sob sistema biométrico, foram provavelmente “emprenhadas”.



O índice de abstenções baixíssimo (6,56% e 7,48%) destoa não só da taxa maranhense (23,9%) como da de outros municípios onde o sistema foi testado (entre 10% e 12% de abstenção). E ainda: nos dois municípios, autorizaram que 2.991 eleitores (6,3% do total) depositassem seu voto mesmo sem terem suas digitais reconhecidas. Roseana Sarney venceu em Paço, com 52,38% dos votos válidos, e em Raposa, com 51,71%.

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