A frase acima é do ex-juiz federal, professor de direito e deputado federal Flávio Dino, 41 anos, um fundador do PT no Maranhão e hoje comunista por opção. Filiado ao PCdoB, ele surge no Maranhão com um ineditismo que espantou até aliados: trocará uma reeleição aparentemente certa para a Câmara pela disputa ao governo do estado, onde Roseana Sarney (PMDB) representa o poder de uma família que desde a década de 60 domina o poder no estado, pelo clã ou através de representantes diretos.
Dino poderia surgir como um Quixote maranhense pelas ideias que prega diante do contraste com os números oficiais que o estado representa no cenário nacional. Ele sonha ser a alternativa dos eleitores e prega um crescimento econômico e social pregando transparência, honestidade e probidade pública. Vai às urnas com PT, PSB e acredita conquistar o PDT
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Que motivos o levou a ser candidato ao governo do Maranhão?
Um motivo objetivo, que é a demanda social por renovação da vida política do estado. Isso é um sentimento bastante nítido e se ampara sobretudo num diagnóstico da realidade maranhense, do que o estado é e do que ele pode ser. Hoje o Maranhão é conhecido nacionalmente como o estado mais atrasado da Federação, do ponto de vista dos indicadores sociais, sobretudo. Quando se fala de analfabetismo se lembra do Maranhão porque o analfabetismo maranhense é o dobro da média brasileira. Quando se fala em IDH se lembra do Maranhão porque o IDH maranhense é o menor da federação.
E assim sucessivamente: mortalidade infantil, submoradias, qualidade da educação em todos os níveis. O paradoxo é que isso não corresponde às potencialidades do estado. Ao contrário, o Maranhão tem uma história reconhecida nacionalmente como um estado de grande importância, inclusive econômica.
Temos condições naturais, uma localização geográfica privilegiadíssima, no chamado meio norte brasileiro; não temos problemas climáticos significativos ao contrário de grande parte do Nordeste, que sofre com período de chuvas desfavorável; o Maranhão é um estado que tem muita água, é cortado por rios diferentes, tem o segundo maior litoral brasileiro – 640 km de litoral – fica a 2 graus da linha do Equador, o que favorece, por exemplo, uma indústria aeroespacial. Tem um complexo portuário de referência mundial pelas suas condições de exploração, condições naturais. Tem três ferrovias implantadas, a ferrovia Norte-Sul, a ferrovia Carajás, e a ferrovia São Luís–Teresina, uma quarta projetada, que é a ferrovia Transnordestina..
Quando você confronta isso com o quadro social, nasce a demanda com a renovação da política, porque é esse o diagnóstico que sustenta a candidatura.
Diante de todo esse cenário positivo que o senhor acaba de narrar, por que o Maranhão está nessa situação?
Porque o modelo político que se cristalizou não foi capaz de levar o Maranhão adiante. Nós tivemos um momento em que havia uma movimentação pela superação do padrão oligárquico de organização da vida política e esse movimento resultou na vitória do então jovem deputado José Sarney, em 1965, para o governo do estado. E a partir daí nasceu um novo ciclo, o ciclo que se anunciava como capaz de levar o Maranhão adiante, ao encontro do seu verdadeiro destino.
O que aconteceu é que houve a ausência de alternância no poder. A ausência de alternância no poder fez com que a vida política perdesse qualidade e, portanto, a gestão pública também perdesse qualidade. A missão que nós temos hoje é a missão republicana de gerar alternância no poder, gerar, portanto, uma reorganização institucional, inclusive para viabilizar a reorganização do estado em outros planos. Então, como as condições infraestruturais, naturais, apontariam para o desenvolvimento, a resposta só poderia estar na política.
O senhor diria que foi uma incompetência das gestões ou foram gestões em causa própria?
Acho que houve a soma de vários problemas. Acho que quando o poder se cristaliza, o poder se eterniza, ele é uma usina de vícios e isso está em Aristóteles.
Está dizendo que o Maranhão é uma usina de vícios?
Que a política maranhense esses anos todos se transformou em uma usina de vícios em razão dessa cristalização, em razão da ausência da alternância de poder. Quando o poder vira um poder totalitário, ele degenera, e é isso que está acontecendo. Então houve a soma de tudo, houve patrimonialismo, no sentido da falta de distinção entre o público e o privado e da apropriação do público e da sua submissão em interesses privados, denúncias graves de corrupção e houve, também nesse sentido gerencial, incapacidade administrativa. Eu não consigo nem identificar qual o problema predominante, esse é o próprio diagnóstico. E qual é a resposta? A resposta só pode ser enfrentar a causa, enfrentar a raiz.
O senhor seria a alternância?
Não eu, propriamente. Há uma geração de lideranças que não estão só na política, estão também no mundo empresarial, estão no mundo dos movimentos sociais e estão no próprio Judiciário, no mundo da magistratura. Há uma demanda social e hoje a minha candidatura é a confluência dessa expectativa. Eu não tenho nenhum tipo de messianismo, nem um tipo de salvacionismo, nem um tipo de bonapartismo ou cezarismo, dizer “ah, eu serei o salvador do Maranhão”, não tenho essa pretensão. Até porque não existe esse personagem. Mas a candidatura é o caminho para que nós possamos ter o ciclo novo realmente democrático no Maranhão.
O senhor diria que essa quebra do ciclo da família Sarney, que domina a política do Maranhão, com o Jackson Lago eleito governador em 2006, foi já uma consequência de um voto mais consciente, ou resultado de um racha na base do poder?
A soma das duas coisas. Há uma situação que é de crise do modelo que se expressa inclusive na difiduldade do estabelecimento da chamada hegemonia política, uma direção que seja aceita socialmente. Isso que levou ao que poderia ser chamada classicamente de crise do vértice do sistema.
Houve uma fissura liderada pelo então governador José Reinaldo Tavares, que pertencia ao grupo Sarney, e isso se conjugou com o sentimento de mudança que se expressa a cada eleição. Foi essa soma que levou à vitória do Jackson. Infelizmente não foi possível ao Jackson levar às últimas consequências esse propósito, por uma série de fatores históricos, fatores do próprio grupo que assumiu o governo com ele. O certo é que essa experiência ficou inconclusa. Não obstante inclusiva, o que lamento, ficou o sentimento de frustração na sociedade, inclusive que agora se recoloca. Uma parte desistiu da mudança. Dizem: “olha, tentamos a mudança e deu errado”. E eu sou taurino, sou persistente, sou obstinado.
Como está a sua base?
Hoje nós temos o apoio do PT e do PSB, além do próprio PCdoB e muitas alianças sociais, movimentos, sindicatos, direções sindicais, lideranças da igrejas, lideranças da juventude, lideranças sociais de um modo geral. Temos um conjunto de forças identificadas com o sentimento de mudança. Em relação ao Jackson, o que eu observo agora, o modo como me conduzo em relação a ele, é de respeito ao que ele representa. Então eu não posso dizer nada diferente do que reconhecer que ele tem direito de ser candidato.
Ele vai sair candidato?
Ele está marcado por muitas incertezas, neste momento.
Há a possibilidade de o PDT vir para a sua chapa?
Há uma possibilidade, sim. O PDT é um partido que compõe conosco a ala esquerda do governo Lula.
O PT decidiu apoiá-lo em detrimento do PMDB de Roseana Sarney, que vai à reeleição, com diferença de apenas dois votos dos delegados. O senhor acredita que o PT vai recuar?
Tenho certeza que não. Foi uma decisão legítima, lá, ainda que com um placar apertado, ali, mas que por trás dele há uma ampla maioria da militância do PT, da base social do PT.
Então os dois votos representam várias militâncias...
Tem 80% do PT hoje conosco. Não vou dizer que temos 100%, também, porque é falso. Temos 80% do PT interessado, engajado, querendo participar da campanha e da pré-campanha. Há muita motivação em relação a isso. Agora, acho que o PT não recua, primeiro, nacionalmente, porque o PCdoB e o PT são os aliados mais duradouros da vida política, da História brasileira.
São seis eleições presidenciais consecutivas, portanto, um casamento longo e feliz do PT com o PCdoB. Então não vejo como, nacionalmente, se dizer que o apoio do PT ao PCdoB no Maranhão contraria a tática nacional.
Qual vai ser a sua bandeira?
Primeiro, um sentimento de esperança de que as coisas podem ser diferentes. A bandeira da mudança, a bandeira que não é a bandeira da mudança oca, destituída de sentido. É uma bandeira da mudança que se embasa, que se apoia numa base natural, numa base real, que é a constatação daquele paradoxo maranhense que me referi no início.
É esse paradoxo que sustenta o discurso da mudança. E o discurso da mudança, além de ser apoiado num diagnóstico real, ele tem um rumo, tem um sentido, que é o sentido dado pelo governo Lula. Nós queremos casar o Maranhão com o Brasil. Nós achamos que o Brasil, sob a liderança do Lula, encontrou um caminho de inclusão social, um caminho de um grande pacto, em defesa da nação, um pacto político bastante amplo e plural, inclusive. E nós somos defensores desse pacto, não questionamos a aliança nacional de modo nenhum. Pelo contrário, defendo a aliança nacional.
O senhor acredita que o presidente Lula vai fazer campanha lá no Maranhão, junto com Dilma, apoiando Roseana ou o senhor?
Em relação especialmente ao presidente Lula, acho que isso vai depender de uma série de fatores da política nacional. Acho que não será uma definição tomada, segundo critérios específicos do Maranhão, até porque nesse sentido não há especificidade na situação maranhense. A situação do Maranhão é igual à situação do Piauí, para não ir muito longe. No Piauí haverá duas correntes políticas, assim como na Bahia, assim como provavelmente em Minas, assim como no Rio Grande do Sul, talvez no Paraná, no mínimo em 10 estados. Então, nesse sentido o Maranhão não estará sozinho. Então o que valer para os outros deve valer para o Maranhão.
Qual a primeira e imediata media que tomará caso seja eleito governador?
Primeiro iria deixar claro para o conjunto da máquina administrativa que ali havia um comando, havia uma direção política, com compromissos bastante nítidos. O primeiro, da probidade, da honestidade na aplicação do dinheiro público.
O segundo, da prioridade às políticas sociais. Essa diretriz ficará bem nítida na conduta do governador. Depois eu irei chamar todos aqueles atores que são os responsáveis pela riqueza do Maranhão. O Maranhão não tem uma única vocação econômica. O Maranhão tem múltiplas vocações econômicas.
Não são grandes projetos que vão salvar o Maranhão. É o contrário, é exatamente a soma dessas múltiplas vocações econômicas, agricultura familiar, a pesca, o extrativismo, a presença do setor de comércio e serviços. Então nós iremos envolver no projeto de desenvolvimento aqueles que tradicionalmente são esquecidos e essa é a razão principal razão, ao meu ver, do subdesenvolvimento do Maranhão.
Eu diria que há uma atitude a ser tomada. E a atitude, ou a postura, é a probidade, a prioridade ao social, desenvolvimento inclusivo, desenvolvimento que leve em conta as múltiplas vocações econômicas.
Colaborou João Batista Araújo