domingo, 23 de outubro de 2011

Estatização não extingue processos contra a Fundação José Sarney

JORNAL PEQUENO




Há processos contra a entidade no TJ-MA e no TCU, resultantes de ações impetradas pelos ministérios públicos Estadual e Federal e de apurações da Controladoria-Geral da União
Por Oswaldo Viviani (JP)
A estatização da Fundação José Sarney – proposta pela filha do ‘patrono’ da entidade, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), e aprovada pela Assembleia Legislativa do estado na quarta-feira (19), apenas três dias após chegar à Casa – não vai extinguir os processos que correm na Justiça e nos órgãos controladores sobre desvios de recursos públicos na entidade. Há processos contra a Fundação Sarney no Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA) e no Tribunal de Contas da União (TCU). Os processos são resultado de ações impetradas pelos ministérios públicos Estadual e Federal (MPE e MPF) e de apurações da Controladoria-Geral da União (CGU).
Ministério Público Estadual – ‘A apuração de responsabilidades não cessa com a passagem da fundação para o Estado’, disse na sexta-feira (21) ao Jornal Pequeno a promotora Sandra Mendes Alves Elouf, titular da Promotoria Especializada em Fundações e Entidades de Interesse Social.
Elouf é autora de uma ação civil pública que exige da Fundação Sarney a devolução aos cofres públicos de R$ 500 mil, desviados de uma verba total de R$ 1,34 milhão, repassada pela Petrobras à fundação em 2005 a título de patrocínio de um projeto cultural que nunca saiu do papel.
Segundo reportagem de O Estado de S. Paulo, em julho de 2009, assinada pelos jornalistas Rodrigo Rangel e Leandro Colon, o meio milhão desviado foi parar em duas empresas ‘fantasmas’ (Centro de Excelência Humana Shalom e MC Consultoria) e outras da família Sarney.
Uma parcela do dinheiro, R$ 30 mil, foi destinada, de acordo com a reportagem do ‘Estadão’, à TV Mirante e a duas emissoras de rádio – a Mirante AM e a Mirante FM.
A ação civil do MP responsabiliza pelos supostos desvios o Conselho Curador da época dos fatos – então presidido por José Carlos Sousa e Silva, advogado do Sistema Mirante e integrante do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (TRE-MA).
Conforme informou a promotora Sandra Elouf ao JP, a ação tramitou inicialmente na 5ª Vara da Fazenda Pública, onde foi julgada improcedente, ainda em 2009, pelo juiz Raimundo Nonato Neris Ferreira. O MP recorreu ao TJ-MA, onde o processo ‘dorme’ há mais de dois anos.


TCU – O processo sobre desvios de recursos da Fundação Sarney igualmente caminha a passos de jabuti no Tribunal de Contas da União, que só acatou a denúncia contra a entidade em janeiro passado – 18 meses após a publicação da reportagem no ‘Estadão’ e um ano depois que uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) confirmou as irregularidades na fundação.
O relator do caso no TCU – que está sob sigilo – é o ministro José Múcio Monteiro, ex-ministro de Relações Institucionais do governo Lula, que tomou posse no tribunal em outubro de 2009, após indicação do ex-presidente.
Não são poucos os que têm certeza de que o caso não vai dar em nada no TCU. No auge da crise do Senado, em julho e agosto de 2009, que por pouco não derrubou o presidente da Casa, José Sarney, José Múcio foi um dos responsáveis por ‘enquadrar’ os senadores petistas que defendiam um pedido de licença de Sarney, a fim de que fossem apurados os fatos mais graves envolvendo o senador – entre eles, os chamados ‘atos secretos’ e os desvios da Fundação Sarney.
MPF – O Ministério Público Federal (MPF) no Maranhão também investiga a Fundação José Sarney desde julho de 2009, por conta das suspeitas de desvio do patrocínio da Petrobras. Já há algum tempo o órgão tem em mãos documentos da fundação (prestações de contas, estatuto e cópia do projeto) e da Petrobras (informações bancárias), mas ainda não ofereceu denúncia nem à Polícia Federal nem à Justiça Federal.
MPE também denuncia desvio de recursos do Estado
Repasses de recursos do governo estadual à Fundação José Sarney em 2004 também são alvo de uma ação por improbidade administrativa do Ministério Público Estadual contra a entidade. A ação foi proposta em dezembro de 2009, pelos promotores Marcos Valentim Pinheiro Paixão e João Leonardo Sousa Pires Leal, robustecida pela reprovação das contas da fundação entre 2004 e 2007, por parte da Promotoria Especializada em Fundações e Entidades de Interesse Social.
Os recursos desviados seriam advindos da Gerência de Estado da Cultura. Segundo o MP, o dinheiro – R$ 960 mil, em 12 parcelas de R$ 80 mil – deveria ser destinado, em sua totalidade, à ‘conservação, divulgação e exposição pública do acervo bibliográfico, documental, textual e museológico’, mas, na prática, pelo menos um terço dos repasses (perto de R$ 320 mil) foi usado para pagar contas de telefone e pessoal, tanto da Fundação Sarney como da Associação dos Amigos do Bom Menino das Mercês (Abom).
Na ação, os promotores Marcos Valentim e João Leonardo pedem a indisponibilidade dos bens da Fundação Sarney e os listam: quatro imóveis na Rua 28 de Julho (nºs 473, 476, 483 e 486) e três na Rua da Palma (nºs 475, 489 e 502).
A Vara da Fazenda Pública, para onde foi inicialmente direcionada a ação, julgou o pedido improcedente. Os promotores recorreram e o caso está agora nas mãos da desembargadora Maria das Graças de Castro Duarte Mendes, do TJ-MA.
Apesar dos percalços legais, a ajuda estatal à Fundação Sarney nunca parou. Em 2010, a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) firmou contrato de patrocínio no valor de R$ 60 mil pelo período de um ano.
Também no ano passado, a entidade recebeu um aporte da Secretaria de Estado da Educação (Seduc) de R$ 338.400, por meio de convênios para utilização do espaço do Convento das Mercês (localizado no bairro do Desterro), que abriga a fundação.
(Com informações de Wilson Lima, do iG)
Contribuinte vai pagar R$ 1,1 milhão anual para manter Fundação Sarney
A estatização da Fundação José Sarney – que está fechada à visitação pública há pouco mais de dois meses – deve custar aos contribuintes maranhenses pelo menos R$ 1,1 milhão por ano. O cálculo é baseado no custo mensal que a entidade teve em 2009: R$ 90 mil.
O dinheiro público escoado para a fundação deve bancar também salários atrasados de mais de 30 funcionários. Eles estão sem receber desde o dia 29 de abril, quando foram dispensados pela direção da entidade – atualmente presidida por Joaquim Itapary, amigo pessoal do senador José Sarney – com a garantia de que iriam continuar recebendo seus vencimentos normalmente. ‘Essa promessa nunca foi cumprida’, denunciou um dos trabalhadores ao Jornal Pequeno em julho.
Será mantido igualmente pelos cofres públicos o acervo da Fundação Sarney – que não foi transferido, como era de se esperar, depois que, em outubro de 2009, o Conselho Curador da entidade comunicou seu fechamento.
Obras de arte, centenas de livros, fotografias e peças diversas fazem parte do acervo. Há ainda documentos privados do ex-presidente da República e desenhos que os filhos de José Sarney faziam quando eram crianças.
O Estado também passará a custear a banda de música da Associação dos Amigos do Bom Menino das Mercês (Abom) e a manutenção do local em que José Sarney quer ser sepultado e ver erguido ali um mausoléu em sua homenagem: um jardim com um chafariz e uma estátua de bronze em tamanho natural do senador, sentado num banco de madeira em pose de intelectual: com as pernas cruzadas e lendo um livro.
Bem cuidado, o espaço dedicado a Sarney – batizado de ‘Jardim dos Poetas’ – contrasta com uma área lateral do convento das Mercês, que virou um ‘lixão’ da comunidade do Desterro.
Procurado pelo JP na sexta-feira à tarde, o presidente do Conselho Curador da Fundação Sarney, Joaquim Itapary, não foi encontrado. O telefone de contato do JP foi deixado com um funcionário administrativo da entidade, de nome Jorge, para ser repassado a Itapary, mas não houve retorno.
(Oswaldo Viviani)

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