POR OSWALDO VIVIANI
O historiador e professor da Universidade Federal do Maranhão (Ufma), Wagner Cabral da Costa, que foi classificado pelo presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP), em resposta publicada na revista Veja à reportagem “Bem-vindo ao Sarneyquistão”, de “radical desequilibrado da oposição raivosa”, enviou à revista sua réplica a Sarney. Nela, Wagner Cabral afirma que “o senador moribundo mais uma vez erra a verdade, buscando limpar sua biografia e promover nova fraude da história”.
Sarney e Wagner Cabral: polêmica
O historiador também afirma que o presidente do Senado apelou “para o surrado chavão de que as críticas promovem uma ofensa ao Maranhão, quando na realidade se dirigem à nefasta e corrupta oligarquia que desmanda e mama no estado, dessa vez se equilibrando na república petista e sua cor local, o sarnopetismo”.Veja a seguir a íntegra da carta de Wagner Cabral, assim como a matéria “Bem-vindo ao Sarneyquistão”, da Veja, e a resposta de José Sarney à revista.
Para manter o ‘Sarneyquistão’, senador marimbondo erra a verdade
Soltando fogo contra minha pessoa, na tentativa de desqualificar-me pessoal, política e profissionalmente, o senador do Amapá e oligarca do Maranhão reitera seus conhecidos métodos de manipulação de informações visando confundir a opinião pública sobre a realidade de Sarneyquistão. Senão vejamos:
1. Em sua resposta a Veja, o “poeta da Arena” cita os dados do PIB (Produto Interno Bruto), quando a discussão era referente ao conjunto de Indicadores Sociais do Maranhão, que demonstram ser o estado o último do país em qualidade de vida da população. 1º erro da verdade.
2. O autor de Sarneyquistão das Águas também nega comandar há 46 anos, alegando não ter envolvimento com a ditadura militar (de quem foi leal e servil presidente do “partido do sim, senhor”), nem com as eleições de governadores pós-1982. Somente tolos acreditam nessa estória da Carochinha, já desmontada por diferentes analistas.
3. Em sugestivo ato falho, o highlander Dono do Mar admitiu que a venda das terras devolutas abriu as portas “a latifúndio, grilagem, expulsão de posseiros e pequenos proprietários rurais”, mas erra a verdade atribuindo a culpa aos governos que lhe seguiram. Não, a responsabilidade histórica dessa política fundiária, que o próprio oligarca admitiu ser “danosa ao Maranhão”, é da Lei no 2979/1969 (Estatuto da Terra ou Lei de Terras do governo Sarney), apenas continuada por seus sucessores.
4. A Lei de Terras de Sarney é criticada há décadas por pesquisadores da realidade agrária estadual, a exemplo de Victor Asselin, afirmando que “com o aparecimento da Lei e das Delegacias de Terras estourou, de verdade, a mais crítica problemática fundiária na história do Estado do Maranhão” (Grilagem: corrupção e violência em terras do Carajás. Vozes, 1982, p. 129).
5. Assim, se escondendo atrás de políticos já falecidos, o Estadista de Curupu tenta novamente falsear a verdade, apelando para o surrado chavão de que as críticas promovem uma ofensa ao Maranhão, quando na realidade se dirigem à nefasta e corrupta oligarquia que desmanda e mama no estado, dessa vez se equilibrando na república petista e sua cor local, o sarnopetismo.
Portanto, percebe-se como, para manter o domínio do Sarneyquistão, o senador moribundo mais uma vez erra a verdade, buscando limpar sua biografia e promover nova fraude da história (não custa lembrar que, recentemente, tentou o mesmo em relação ao impeachment de Collor e aos arquivos da ditadura).
Wagner Cabral da Costa
Historiador / Ufma
São Luís, MA
Bem-vindo ao Sarneyquistão
Em quase cinco décadas de domínio, Sarney pouco fez para livrar o Maranhão da pobreza
“A terminação “istão”, em algumas das línguas faladas na Ásia Central, significa “lugar de morada” ou “território”. Assim, o Quirguistão é o lugar de morada dos quirguizes. O Cazaquistão, o território dos cazaques, e o Tadjiquistão, dos tadjiques. Também por esse motivo, o estado do Maranhão – tão miserável quanto as antigas repúblicas da extinta União Soviética e igualmente terminado em “ão” – poderia muito bem ser rebatizado de Sarneyquistão.
Há 46 anos, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), ao lado de sua família e apaniguados, comanda o estado que, segundo o Censo 2010, abriga 32 dos cinquenta municípios mais miseráveis do país.
Quando Sarney chegou pela primeira vez ao poder, no longínquo ano de 1965, o Maranhão ocupava as últimas posições do ranking nacional de desenvolvimento. A partir de então, seu grupo venceu dez eleições para governador, chefiou o Executivo local por 41 anos e… conseguiu o feito de nada mudar.
O “Sarneyquistão” continua ostentando os indicadores sociais mais vexatórios do país, comparáveis aos das nações mais desvalidas do planeta. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) concluído há duas semanas mostra que a pobreza extrema atinge 14% da população. Em 82 das cidades do estado, a renda média é inferior ao que o Bolsa Família paga em benefícios.
Outro estudo afirma que 78% dos maranhenses dependem de algum programa oficial de transferência de renda. E não foi a natureza que condenou os maranhenses à miséria.
O estado foi um dos mais prósperos do Brasil até o século XIX. Tem uma localização estratégica, mais próximo dos países ricos do Hemisfério Norte, e terras férteis (que só recentemente, com o cultivo da soja, passaram a ser devidamente exploradas). Seus habitantes vivem no atraso por outras razões.
O historiador Wagner Cabral da Costa, da Universidade Federal do Maranhão, identifica três delas. Nos anos 60, o governo estadual distribuiu grandes extensões de terra a empresas privadas, com a justificativa de assim desenvolver a economia local. A consequência foi a formação de latifúndios improdutivos que, utilizados para atividades altamente subsidiadas, como a exploração de madeira e pecuária, resultaram em quase nenhum retorno financeiro para a economia maranhense.
O autor da medida? Ele mesmo, José Sarney. Pautados pelo menos duvidosos critérios que não necessariamente os do interesse público, seus sucessores deram continuidade ao erro, esvaziando os cofres do estado para levar para lá indústrias que demandavam pouca mão de obra. Resultado: metade da população economicamente ativa hoje depende da pequena agricultura.
Segundo o historiador, a terceira razão do atraso é a corrupção. “No Maranhão, ela é endêmica”, diz Cabral da Costa. “A rigor, a República nunca chegou por aqui.”
Em quase cinco décadas, Sarney só perdeu o domínio sobre o seu Sarneyquistão uma vez. Em 2006, Jackson Lago (PDT) derrotou sua filha e herdeira política, Roseana, que concorria ao terceiro mandato de governadora. Mas foi apenas um hiato na história. Em 2009, Lago teve o mandato cassado por compra de votos. Morreu há três meses, não sem antes ver seu adversário ressurgir das cinzas com uma aliança inusitada. Com apoio do ex-presidente Lula, Sarney engajou o PT no projeto de perpetuação de seu clã, conseguiu mais um mandato para Roseana e indicou os titulares dos principais órgãos federais do estado. Lá, a aliança dos dois antigos inimigos foi batizada de “sarnopetismo”. O Maranhão não merecia mais essa praga. (Leonardo Coutinho, da Veja)
RESPOSTA DE JOSÉ SARNEY À MATÉRIA DA VEJA
Sobre a reportagem “Bem-vindo ao Sarneyquistão” (29 de junho), abandonando as críticas pessoais, refuto os fatos.
O Maranhão não é o último estado do país. É o 16° (IBGE), e seu PIB é superior ao de Mato Grosso do Sul, Paraíba, Rio Grande do Norte e ao de oito estados mais.
O Brasil é a sétima economia mundial, mas seu IDH (um índice recente que não se pode generalizar como da pobreza de um país) é o 73° colocado, atrás da Albânia, Macedônia e etc. (Pnud 2010).
Não comando o Maranhão há 46 anos. Há 33 não disputo uma eleição no estado (desde 1978). Os governadores que me sucederam foram indicados em eleição indireta pelos militantes de 1964, à exceção de Luiz Rocha, Cafeteira, Lobão e Roseana, que quem conhece sabe que anda pelas próprias pernas e tem liderança forte, que disputaram eleições diretas. Não mandei em nenhum deles.
As leis que permitiram a venda de terras devolutas do estado não são minhas, e sim do governador Antônio Dino (Lei n°3002, de 13 de outubro de 1970) e do governador Pedro Neiva (Lei nº3230, de 6 de dezembro de 1971), que abriram as portas a latifúndio, grilagem e expulsão de posseiros e pequenos proprietários rurais.
Essa política tem minha discordância, e a Lei de Terras que fiz, revogada por eles, elaborada por uma comissão que presidia por um notável homem de esquerda, Bandeira Tribuzi, visava justamente ao contrário, ordenar uma estrutura agrária em pequenas propriedades.
Assim, nenhuma responsabilidade tenho por essa política fundiária que considero ter sido danosa ao Maranhão. O historiador citado por veja, ninguém conhece no Maranhão como tal, e sim como um radical desequilibrado da oposição raivosa.
Se um homem só pudesse tornar estado em pobre ou rico, em cinqüenta anos o mundo seria diferente.
Para finalizar, a renda domiciliar do Maranhão na década passada cresceu 46%, enquanto em São Paulo somente 3% (IBGE).
Assim, o agravo, mais ao Maranhão do que a mim, é fruto de uma campanha feita pelos governos anteriores ao da Roseana, para desmoralizar o estado e atingir-me, nessa repetição absurda da pobreza do Maranhão.
José Sarney
Senador
Brasília / DF
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